segunda-feira, 9 de junho de 2008

Érico Veríssimo Vida e Obra no Contexto Político

Um exemplo de obra do peródo que nos propomos a estudar foi " ARepública" obra essa que foi escrita na época em que Getúlio Vargasrenunciou, e o Brasil viveu até 1964 um regime democrático parlamentarcom liberdade de manifestações políticas e culturais. É interessantenotar que contrariamente ao que ocorreu até 1945 e até o dia 31 demarço de 1964 Érico Veríssimo se manteve neste período de governocívil liberal numa certa reserva, ou seja não se manifestou muitonesta época de normalidade política. O escritor se fechou em seu gabinete e trabalhou no quefoi considerado por muitos a sua obra mais importante, a famosatrilogia O Tempo e o Vento, iniciada em 1947 com O continente e sóinteiramente terminada em 1962, com o fim de O Arquipélago. Nesseínterim, depois de O Continente e O Retrato, publicou Noite, umacoletânea de contos e novelas ("A Ponte", "Esquilos de Outono",Sonata"), além de um livro de impressões sobre a viagem ao México.A atividade de Érico Veríssimo, porém, não se limitou à sua obra.Durante dois anos e meio (1953-1956) ele dirigiu em Washington oDepartamento de Assuntos Culturais da União Pan - Americaca, sucedendoneste posto a Alceu Amoroso. Participou ainda de muitos congressos,mesas redondas simpósios, através de diversos países da América Latinae intensificou suas conferências pelos Estados Unidos.Em 1961 passou por u período de intenso trabalho em O Arquipélogo esofreu um sério infarto, que por pouconão lhe custou a vida. No ano de 1964 já terminado O Tempo e o Vento, Veríssimotrabalhou num novo romance ,O Senhor Embaixador, publicado no anoseguinte. Em 1966 a Editora José Aguilar decidiu publicar a ficçãocompleta de Veríssimo.
Para tanto o autor, apesar de sempre ter recusado a escrever sobre suavida, redige um ensaio autobiográfico intitulado O escritor diante doespelho, onde desabafa: " perdi todo o interesse pelo personagemcentral". Em 1966 fez algumas viagens à Europa e Israel. Desta última nasceuoutro livro de viagem: Israel em abril. Desde O arquipélago, ÉricoVeríssimo não publicou nenhum romance voltado para a realidade de seupaís. Em 1971 ele retomou a temática brasileira com Incidente emAntares. Essas três obras, O Senhor Embaixador, O prisioneiro e Incidente emAntares, são as que despertaram maior interesse para o estudo doaspecto político em sua obra. Foi dito que Veríssimo, depois de 1964, volta a defender publicamentesuasposições políticas. Talvez a de maior repercussão tenha sido suaoposição ferrenha à lei de censura prévia instaurada sob a presidênciado general Médici, em 1970. Muitos dos maiores nomes de literaturabrasileira vão associar-se à sua atitude,numa recusa veemente emsubmeter seus livros á censura. Em novembro de 1974, sob a presidência do general Geisel,organizam-se em eleições legislativas em todo o Brasil. Dois partidosconcorem: a Arena, situacionista, eo MDB, representante da oposição.Poucos dias antes da eleição, alguns jornais publicaram uma carta deÉrico Veríssimo apoiando o candidato do MDB de porto Alegre, o Sr.Paulo Brossard. Esse é um dos exemplos da indicação clara danecessidade que o escritor sentia de participar da vida política deseu país, denunciando corajosamente o que considera errado ou nocivo. Após Incidente em Antares, um novo sucesso editorial marcou omercado do livro do Brasil, ou seja, a publicação de suas memórias,que se iniciava em Solo de clarineta. Ao completar setenta anos, Érico Veríssimo era uma figura conhecida,respeitada e admirada em todo o Brasil, além de ser lido em mais detreze línguas. Foi e continua sendo atacado por facções ora de direitaora de esquerda, e não raro por ambas ao mesmo tempo. Mas a suaindependência de espírito, sua coragem e firmeza de caráter, jamaispoderão se negadas. Talvez seja devido exatamente a essaspeculiaridades que suas idéias repercutem tão amplamente num país quenão costuma dar a seus intelectuais a importância que lhes é devida.

Fonte: Fresnot,Daniel.O pensamento político de Érico Veríssimo.Rio de Janeiro, edições do Graal, 1977,(p 8-12)

Érico Veríssimo : 1958 - 1968

Érico Veríssimo, desde o momento em que começou a ganhar notoriedade, viveu entre dois fogos bem distintos, como escritor: o da extrema – direita que enxergava nele um encapuzado, um melífluo agente de "teorias exóticas, estranhas aos sentimentos do povo e da civilização ocidental cristã", e o da extrema - esquerda que não se conformava com a posição do romancista recusando-se sempre a transformar suas obras em contundentes panfletos da doutrinação partidária. O poeta prosseguiu impávido na sua vocação literária, uma das mais fortes e genuínas que o Brasil já conhecera.
Quando sua voz e sua presença como homem extinguiram-se, houve uma busca bem consciente e reparadora por parte daqueles que nunca havia se conformado em ver negado ao escritor aquilo que sempre foi uma marca, ou seja, uma tônica em sua vida; que era a disposição de usar sua poderosa arma na defesa da integridade do homem, da dignidade da pessoa humana, do respeito aos direitos dos cidadãos, atingindo sem desânimos a tirania e os seus déspotas, o poder da força, a opressão, as diferentes formas de ditaduras que neste país existiam e ainda sobreviviam, enfim, tudo aquilo que rebaixava o homem a escravo, a liberdade a simples condicionamentos de sobrevivências, os direitos em deveres, além das contínuas tentativas de se desfazer, desmerecer todo um povo sob uma grande vontade que se arvora em divina e que teria recebido dos céus o mandato interminável de zelar pelo que entendem ser a ordem, a disciplina, a obediência e até mesmo a subserviência.
A grandeza de Érico como escritor chegou a ser, em vários momentos, contestada. E no fundo das campanhas, latentes e visíveis, os condicionamentos não políticos, mas partidários.
"Sou simples contador de histórias" era uma frase ditada pela modéstia do escritor e que foi desde logo agravada com unhas e dentes pela voracidade dos que se empenhavam em destruí-lo. Para esses essa frase passou a ser julgada como algo bem pejorativo, como se fosse a função do escritor, sobretudo a do romancista, não fosse precisamente esta.
A crítica tendenciosa não levou em conta, que embora vivendo em sociedades distintas de um mesmo país, Jorge Amado com Jubiabá, José Lins do Rego com Bangüê e Erico Veríssimo com Música ao longe eram instrumentos e intérpretes da mesma crise social que marcava a transformação de seu próprio meio ambiente.
Flávio Loureiro Chaves, o maior estudioso e conhecedor da obra do escritor, aborda esse ponto com total segurança, pois esse assunto não havia sido abordado com devida atenção, como o estudioso retratou naquele momento.
Com muita autoridade Flávio observa que enquanto Jorge Amado retrata "um mundo secular da propriedade que está se esfacelando", já Graciliano Ramos é mais seco e mais duro, justamente porque vivia então num mundo onde valores seculares não davam nenhuma de se desfazer, daí o engajamento político de quem sentia necessidade de atuar como elemento de mudança e não apenas como fator de denúncia.
Érico Veríssimo conseguiu vencer a tendência generalizada dos intelectuais gaúchos que se agarravam ao regionalismo numa antítese aos primeiros romances de Jorge Amado.
"Em Érico Veríssimo a práxis literária culmina o compromisso com o próprio mundo em crise – o compromisso com Floriano Cambará e da personagem de O Prisioneiro – para renunciar à neutralidade da linguagem, definindo uma expressão que, se não é partidária em nenhum momento, vem a ser histórica e política no cerne de sua motivação. O ato de "contar a história" não nega o mundo: narra-o na existência de criaturas fictícias, procurando divisar a liberdade humana que algum dia existiu".
Josué Guimarães, Porto Alegre, Novembro de 1976.


Fonte:Fresnot, Daniel
O pensamento político de Érico Veríssimo. Rio de Janeiro, Edições do Graal, 1977.XIV ed. Pág. 9-12

Veríssimo e 1968, o ano que derrubou a literatura



Abaixo, segue uma pesquisa muito interessante sobre o contexto cultural, social e político em que Érico Veríssimo se enquadrava.

Quem desferiu o golpe foi a moderna indústria cultural, através de dois produtos sofisticados e eficazes: a canção e a telenovela

O título é um exagero. É um exagero? É e não é. Para quem vinha com os sonhos de país grande e desenvolvido, que estava em vias de generalizar a educação básica para todos, fazer a reforma agrária que tiraria o campo da Idade Média, hospedar e desenvolver a indústria moderna, alcançar o futuro, em suma - para quem vinha desse sonho, 1968 e seus entornos foram mesmo um golpe quase letal na literatura. Quem desferiu o golpe foi a moderna indústria cultural, por meio de dois de seus produtos mais sofisticados e eficazes: a canção e a telenovela.Antes de falar delas, vale uma recuperação do contexto. Por um momento, o leitor considere que na década de 1960 o Brasil acompanhava ao vivo o auge da carreira e do talento dos seguintes escritores: Manuel Bandeira, Jorge Amado, Erico Verissimo, Clarice Lispector, Guimarães Rosa, Nelson Rodrigues, Rubem Braga, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Mario Quintana; para não dizer que não falei de gente menor mas muito interessante, também estavam em ponto alto de seu desempenho gente como os poetas concretos, Antônio Callado, Carlos Heitor Cony, Dalton Trevisan. Uma outra geração, mais recente, apresentava suas armas: nos mesmos anos 1960 ou pouco antes estrearam Rubem Fonseca, Moacyr Scliar, Ferreira Gullar, Armindo Trevisan e vários outros.Não era pouca coisa, e pelo contrário era muita. Considerada como conjunto, essa época não tem nada do mesmo nível em qualquer outro momento da vida do país e mesmo da língua portuguesa. Em todos os gêneros (deixei de falar da crítica literária, que no entanto estava também num belo momento, com os já clássicos Tristão de Athaíde, Álvaro Lins, Augusto Meyer, Guilhermino César, mais alguns acadêmicos talentosos como Antonio Candido, e a nova geração, com José Guilherme Merquior e Roberto Schwarz à frente), a literatura estava muito bem servida. Todos os gêneros: inclusive no mais árduo de todos, ao que parece, no Brasil, a dramaturgia. Estava ali Nelson Rodrigues, ao lado de Dias Gomes e outros, mandando bala e vendo nascer uma nova e talentosa geração, a de Plínio Marcos, Gianfrancesco Guarnieri, Augusto Boal, Oduvaldo Vianna Filho, Chico Buarque.O que essa gente representava, vista à distância de mais de 40 anos, era a esperança, quase a certeza, de que, estando maduros em matéria de produção literária, poderíamos esperar maturidade também na outra ponta do processo, a leitura, a criação e o desenvolvimento de leitores, massas de leitores, para usufruir tal e tamanha qualidade. As gerações em atuação naquele momento, somadas ao patrimônio anterior já produzido na língua - Camões, Vieira, Machado, Fernando Pessoa, Graciliano - , nos autorizava a sonhar com uma comunidade real de leitores, que deixaria no passado as terríveis sombras sociais que por tanto tempo excluíram a população do ensino, da leitura, da inteligência formal.Mas veio o Golpe de 64, que em 1968 ganharia contornos mais restritivos ainda contra o exercício da inteligência; veio uma reforma de ensino que emburreceu enormemente a escola e a universidade; e veio também, como uma onda irresistível para os países com tradição frágil justamente na leitura e na crítica, a moderna indústria cultural, que oferecia às massas uma série de itens de lazer e refrigério para a alma, itens que por certo iriam expressar as ideologias em disputa naquele momento. Eram eles a música jovem, mais precisamente a canção, e a telenovela. Usufruindo dessas duas novidades, as massas supririam suas necessidades de poesia e de narrativa, respectivamente. A poesia de livro, assim como o romance e mesmo o teatro, sentiram o tranco, porque a curva ascendente em que vinham fatalmente decairia, e assim também as esperanças de um país de leitores em grande quantidade, que ainda não temos.A música popular se expressava em variados estilos. Havia o rock, de grande impacto entre a garotada menos letrada e suburbana - e quem não era pouco letrado e suburbano, num país de intensa migração para as cidades? - , que no Brasil floresceu principalmente na figura da Jovem Guarda, com um grande artista como Roberto Carlos protagonizando a cena, rock que conhecia desdobramentos mais e mais criativos, com um ponto alto na obra dos Beatles, que em 68 lançaram pérolas como Hey Jude e Revolution, mais todo o Álbum Branco. Havia a bossa nova, surgida em 1958 mas consolidada nos anos 60, contando com um trio de gênios na vanguarda, o músico e maestro Tom Jobim, o poeta e agora letrista Vinícius de Morais e o intérprete-criador João Gilberto, geradores de um patrimônio que se desdobraria na obra de muita gente boa, a começar de Chico Buarque; por fora da bossa nova, que ganhou o coração da juventude mais descolada e culta, corria sua carreira o samba, já com uma história considerável, que estava apresentando ao mundo uma notável renovação com um Paulinho da Viola.A matéria folclórica das regiões rurais e/ou atrasadas do Brasil recebia tratamento novo, agora combinada com denúncia das desigualdades sociais e promessas de revolução, como foi o caso exemplar de Geraldo Vandré e Theo de Barros em Disparada, mas era também o alimento de um talento discreto como Edu Lobo. De dentro do mundo negro, que no final dos anos 60 se percebeu dotado de "Black Power", brotavam variedades sensacionais de música, que no Brasil se expressaram no talento de Jorge Ben, Wilson Simonal e Tim Maia. E havia uma intensa troca entre todas essas modalidades de música, de vez em quando trombando com visões conservadores que pretendiam purismo (a risível passeata contra o uso da guitarra elétrica foi um caso), mas noutras vezes encontrando soluções de grande criatividade e impacto, como ocorreu na obra de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Mutantes e Tom Zé, que entraram em circuito até com gente da música erudita, como o maestro Rogério Duprat.Convenhamos: a poesia perdeu terreno para uma geração de talentos, dentre os quais alguns gênios, que na canção realmente abastecem parte grande das necessidades líricas do brasileiro e de todo mundo que freqüente o português. Atire a primeira pedra, iaiá, aquele que não tem meia dúzia de canções como hinos pessoais, repetidos na memória e no coração como mantras.Para azar da literatura lírica, a de livro, esse poderoso grupo se expressava, nos anos 60, não apenas em shows e em discos, mas no veículo moderno, moderníssimo, veloz, de sucesso acachapante e mais uma vez irresistível pela baixa tradição letrada, que era a televisão. Foram os tempos dos festivais da canção, no Rio e em São Paulo, gerados por estações de tevê que viram cair em seu colo, em 1969, a transmissão via satélite, outro marco da história cultural do país, por alinhar na mesma emissão a maior parte do território do país. Não é exagero dizer que a canção brasileira fez a tevê, tanto quanto esta fez a canção, quanto ao impacto massivo.E para azar da literatura narrativa, a de livro, a mesma televisão incorporou a tarefa de contar histórias. Não foi só no Brasil que tal aconteceu, claro, mas aqui, mais uma vez pela fragilidade da leitura e mais uma vez pelo grande talento de dramaturgos, atores, diretores e os mesmos cancionistas e músicos, a telenovela triunfou de modo impressionante. No plano popular trivial, tratava-se apenas de passar para o reino da imagem o que antes era a radionovela, como ocorreu com o melodrama folhetinesco O Direito de Nascer, que foi ao ar em 1964 e 1965; mas no plano mais moderno, mais jovem, mais urbano e dotado até de ironia e crítica, apareceu em 1968/1969 Beto Rockfeller, novela de Bráulio Pedroso, com uma inacreditável atualidade em matéria de linguagem e comportamento: protagonistas jovens, na São Paulo que crescia como sempre, tentando descolar um jeito de se dar bem. (Um paralelo literário para pensar: um dos primeiros romances relevantes escritos no Brasil é Memórias de um Sargento de Milícias, de 1852, com linguagem arejada e um protagonista jovem, querendo descolar um jeito de se dar bem.)A literatura (de livro) perdeu terreno, ou ao menos deixou de ganhar, o que é uma lástima, vistas as coisas do ângulo da cultura exigente e do debate crítico; mas perdeu para duas modalidades artísticas de grande interesse, que em seus melhores momentos se mostraram capazes de expressar profundamente a vida de nosso tempo e de nosso lugar, o que é um ganho, do ponto de vista da dinâmica real da vida cultural. No fim das contas literatura de livro não morreu, e aliás até recobrou força no fim do ciclo autoritário de 1964, quando, junto com a canção e a telenovela, repensou o país. Não estamos no melhor dos mundos, por certo; mas creio que o legado real de 1968 obriga a espantar as ilusões e reinventar nosso lugar no mundo.

Extraído: http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a1950865.xml&template=3898.dwt&edition=10016&section=102 – acesso em 09 de junho de 2008.
Texto de LUÍS AUGUSTO FISCHER Professor, doutor em letras e escritor

Érico Veríssimo : de 1951 aos tempos mais atuais

No ano de 1951, é lançado o segundo livro da trilogia “O tempo e o vento”: “O retrato”. O trabalho não tão bem recebido pela crítica como o primeiro livro. Assume, em 1953,a convite do governo brasileiro, em Washington, EUA, a direção do Departamento de Assuntos Culturais da União Pan-Americana, na Secretaria da Organização dos Estados Americanos, substituindo a Alceu Amoroso Lima.No ano seguinte, é agraciado com o prêmio Machado de Assis, concedido pela Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto de sua obra. Lança “Noite”, novela que é traduzida na Noruega, França, Estados Unidos e Inglaterra. Visita, face às funções assumidas junto à OEA, diversos países da América Latina, proferindo palestras e conferências. De volta ao Brasil, em 1956, lança “Gente e bichos”, coleção de livros para crianças. Sua filha casa-se com David Jaffe e vai morar nos Estados Unidos. Dessa união nasceriam seus netos Michael, Paul e Eddie.Em 1957, publica “México”, onde conta as impressões da viagem que fizera àquele país.”O arquipélago”, terceiro livro da trilogia “O tempo e o vento”, começa a ser escrito em 1958. Tem um mal-estar ao discursar na abertura de um congresso em Porto Alegre. Consegue se refazer e disfarçar o ocorrido.Acompanhado de sua mulher e do filho Luis Fernando, faz sua primeira viagem à Europa, em 1959. Expõe sua defesa à democracia em palestras proferidas em Portugal e entra em choque com a ditadura salazarista. Lança “O ataque”, que reunia três contos: “Sonata”, “Esquilos de outono” e “A ponte”, além de um capítulo inédito de “O arquipélago”. Passa uma temporada na casa de sua filha, em Washington.Dedica-se, em 1960, a escrever “O arquipélago”.Em 1961, sofre o primeiro infarto do miocárdio. Após dois meses de repouso absoluto, volta aos Estados Unidos com sua mulher. Saem os primeiros tomos de “O arquipélago”. O terceiro tomo de “O Arquipélago” é publicado em 1962, concluindo o projeto de “O tempo e o vento”. O volume é considerado uma obra-prima. Visita a França, Itália e a Grécia.A mãe do biografado falece em 1963.Em 1964, seu filho Luis Fernando casa-se com Lúcia Helena Massa, no Rio de Janeiro, cidade para a qual ele se mudara em 1962. Dessa união nasceriam Fernanda, Mariana e Pedro. Insurge-se contra o golpe militar e dirige manifesto a seus leitores em defesa das instituições democráticas. Recebe o título de “Cidadão de Porto Alegre”, conferido pela Câmara de Vereadores daquela cidade.Ganha o Prêmio Jabuti – Categoria “Romance”, da Câmara Brasileira de Livros, em 1965, com o livro “O senhor embaixador”. Volta aos Estados Unidos.A convite do governo de Israel, visita aquele país em 1966. Vai aos Estados Unidos, mais uma vez, visitar seus familiares. Escreve “O prisioneiro”, que seria lançado em 1967. A Editora José Aguilar, do Rio de Janeiro, publica, em cinco volumes, o conjunto de sua ficção completa. Desse conjunto faz parte uma pequena autobiografia do autor, sob o título “O escritor diante do espelho”. ”O tempo e o vento”, sob a direção de Dionísio Azevedo, com adaptação de Teixeira Filho, estréia na TV Excelsior, em 1967. No elenco, Carlos Zara, Geórgia Gomide e Walter Avancini. É agraciado com o prêmio “Intelectual do ano” (Troféu Juca Pato”), em 1968, em concurso promovido pela “Folha de São Paulo” e pela “União Brasileira de Escritores”.No ano seguinte, a casa onde Érico nascera, em Cruz Alta, é transformada em Museu Casa de Érico Veríssimo. Lança “Israel em abril”.Em 1971, é editado o livro “Incidente em Antares”. Em 1972, comemorando os 40 anos de lançamento de seu primeiro livro, relança “Fantoches”, onde o autor acrescentou notas e desenhos de sua autoria.Amplia sua autobiografia, publicada em 1966, fazendo surgir suas memórias — sob o título de “Solo de clarineta” — cujo primeiro volume é publicado em 1973.O escritor falece subitamente no dia 28 de novembro de 1975, deixando inacabada a segunda parte do segundo volume de suas memórias, além de esboços de um romance que se chamaria “A hora do sétimo anjo”. Carlos Drummond de Andrade faz homenagem ao amigo fazendo publicar o seguinte poema:

A falta de Érico Veríssimo Falta alguma coisa no Brasildepois da noite de sexta-feira.Falta aquele homem no escritórioa tirar da máquina elétricao destino dos seres,a explicação antiga da terra.Falta uma tristeza de menino bomcaminhando entre adultosna esperança da justiçaque tarda - como tarda!a clarear o mundo.Falta um boné, aquele jeito manso,aquela ternura contida, óleoa derramar-se lentamente.Falta o casal passeando no trigal.Falta um solo de clarineta.
Postumamente, é lançado, em 1976, “Solo de clarineta – Memória 2”, organizada por Flávio Loureiro Chaves.”Olhai os lírios do campo”, com adaptação de Geraldo Vietri e Wilson Aguiar Filho, é a novela apresentada pela TV Globo, em 1980, sob a direção de Herval Rossano. No elenco, Cláudio Marzo e Nívea Maria. A esposa do autor, Mafalda, e a professora Maria da Glória Bordini, da PUC-RS, iniciam a organização dos documentos por ele deixados, em 1982.É instalado, no programa de Pós-Graduação em Letras da PUC-RS — como projeto de pesquisa do CNpQ, o Acervo Literário de Érico Veríssimo, em 1984. A coordenação fica a cargo da professora Maria da Glória Bordini.No ano seguinte, a Rede Globo leva ao ar a série “O tempo e o vento”, adaptação de Doc Comparato e Regina Braga, direção de Paulo José, com Glória Pires, Armando Bogus, Tarcísio Meira e Lima Duarte, entre outros. Em 1986, o Museu de Cruz Alta torna-se Fundação Érico Veríssimo.O índice de toda a obra de Érico é informatizado através do Projeto Integrado CNpQ – Fontes da Literatura Brasileira, que o disponibiliza para consulta, em 1991.Em 1994, seu filho Luis Fernando assume a presidência da Associação Cultural Acervo Literário de Érico Veríssimo, entidade encarregada de cuidar de toda a documentação literária do escritor. “Incidente em Antares”, adaptado por Charles Peixoto e Nelson Nadotti, com direção de Paulo José e constando de seu elenco Fernanda Montenegro,e Paulo Betti, é apresentada pela Rede Globo.A UFRS homenageia o autor, pela passagem dos 90 anos de seu nascimento, com uma mostra documental no salão de sua Reitoria. A PUC-RS realiza seminário internacional, coordenado por seu Programa de Pós-Graduação em Letras, em 1995.Organizada por Maria da Glória Bordini, publica-se, em 1997, “A liberdade de escrever”, coletânea de entrevistas do autor sobre política e literatura.Em 2002, a Globo inicia a edição definitiva da obra completa do autor. É inaugurado o Centro Cultural Érico Veríssimo, destinado à preservação do Acervo Literário e da memória literária do Rio Grande do Sul. Morre Mafalda Veríssimo, viúva do escritor, em 2003.

Érico Veríssimo nos Estados Unidos ...

De uma série de conferências sobre literatura brasileira que foram proferidas pelo escritor brasileiro (gaúcho) Érico Veríssimo (1905-1975) na Universidade da Califórnia-Berkeley, a convite do Departamento de Estado norte-americano, no ano de 1944, apresentamos aqui algumas considerações pertinentes ao tema proposto, destaca-se o papel que o escritor reivindicou para o Brasil no novo cenário que se desenhava no continente americano em meados da década de 1940. Publicadas em inglês em 1945, com o título de Brazilian literature – anoutline, foram consideradas pelo próprio autor como um trabalho sem importância, tendo permanecido praticamente desconhecidas da crítica brasileira até sua tradução e publicação no Brasil, depois de exatos cinqüenta anos da edição original.
Num contexto conturbado, marcado pela segunda guerra mundial, pelo autoritarismo do Estado Novo no Brasil e pela política da “boa-vizinhança” implementada pelo governo de Franklin Roosevelt para a América Latina, Érico Veríssimo situa para a platéia norte-americana a literatura brasileira como meio exemplar para o diálogo interamericano, pois por ela se revela a especificidade da identidade brasileira, cujo caráter “mestiço” e “mesclado”, bem representado por Macunaíma o herói sem nenhum caráter, se mostraria como uma alternativa às relações assimétricas entre os Estados Unidos e o Brasil e, de modo geral, entre os Estados Unidos e a América latina.
É nesse contexto que Érico Veríssimo chega aos Estados Unidos e seu objetivo é mostrar que o Brasil pode contribuir no proposto diálogo panamericano, equilibrando o materialismo ianque com o “caráter mais humano” do brasileiro, pois – diz Veríssimo - somos antes mágicos que lógicos. Somos poetas e não profetas. Entre palavras e idéias, aderimos às palavras e começamos a brincar cheios de alegria com elas. Somos um povo que prefere a paixão à razão. (VERISSIMO, 1995: 58).
Colocando em xeque a invenção estereotipada do país, vai questionando de modo diplomático – eis que convidado oficial – o discurso da “boa vizinhança”, naquilo que camuflava os interesses estratégicos de dominação, reivindicando uma negociação mais “justa”, por assim dizer, no conjunto das relações entre EUA e Brasil, visando, é claro, não sensibilizar o establishment político-econômico, mas os grupos acadêmicos a quem falava. Assim, pela apresentação da literatura brasileira busca despertar a simpatia da platéia, ou depois, do público leitor, pela alma brasileira, cuja essência, embora estranha e mal compreendida pelos norte-americanos, está com eles no “mesmo barco, numa travessia muito incerta e tempestuosa, e o menos que podemos fazer com sabedoria é tentar compreender nossos companheiros de viagem”. (VERISSIMO, 1995: 17).

domingo, 8 de junho de 2008

Mais um pouco sobre Veríssimo ...

A ficção de Érico Veríssimo guarda um viço, um frescor de obra recém-criada, como nenhuma outra no tempo. Uma comoção, uma autenticidade que não é fruto da técnica ou do estilo. Talvez explique que lhe retomemos as narrativas como se fossem pela primeira vez. E provavelmente mais do que a de seus companheiros de geração, testemunham a íntima relação entre as estruturas adotadas e os segmentos ou modulações da realidade abrangida.
Longe de evoluir em linha reta, Érico parece ter procurado até o fim a melhor forma de exprimir sua visão de mundo. Se duas maneiras ou estruturas descortinam ao longo desse percurso, é porque a oscilação não corre por conta da simples preferência estética: revela também, senão, preponderantemente, motivações de ordem ética ou ideológica. Mesclando-se incontáveis vezes no fio dos anos, uma e outras assinalam um embate que persistia mesmo quando uma delas se afigurava vitoriosa.
Érico Veríssimo principia com uma novela adocicada – Clarissa – da linhagem da Moreninha, Inocência e outras do gênero. Escrita em 1932, numa altura em que a ficção nordestina dava mostras de se engajar na luta social pela emancipação dos humilhados e ofendidos, é uma história suave, de uma adolescente sonhadora. É quase uma narrativa para jovens.
Assim, as duas vertentes, a da tradição lírica, que remonta longinquamente ao Romantismo e mais de perto ao Simbolismo, e a da modernidade, se defrontam na obra de 1933, apontando os caminhos que o autor trilharia, praticamente até o fim.
Certamente dando conta de que Clarissa parecia seguir figurino obsoleto, Érico Veríssimo decide investir na modernidade e escreve Caminhos Cruzados. Num movimento dialético, que vai percorrer-lhe toda a obra, procura fixar o reverso da medalha. Onde se via sinal negativo, punha-se o positivo, e vice-versa; onde imperava o lirismo evanescente, desabrochava agora o verismo, e assim por diante. Sem abandonar, no entanto, as ligações com as formas crepusculares da estética simbolista.
Érico Veríssimo reconhece tratar-se dum “romance um tanto frio e cínico”. Não obstante, era de suas narrativas mais ousadas e, quem sabe, a mais bem realizada antes dO Tempo e Vento. Romance típico, experimenta as técnicas modernas patentes no autor dO Contraponto, como o simultaneísmo da ação e o associacionismo. Rompida a seqüência temporal, característica da novela e predominante no romance tradicional, o ficcionista focaliza cenas passadas ao mesmo tempo em lugares diferentes, aglutinadas por correlação, como se um liame secreto vinculasse o destino e as ações dos personagens. Esse recurso dá mostras de requinte na confluência de casos ocorridos no mesmo prédio de apartamentos, iniludível embrião dO resto é silêncio.
O tom de sátira contra o cinema, uma sátira à inglesa, não esconde o impacto dessa arte sobre o próprio autor, a principiar na técnica narrativa e a terminar na ambiência de suas histórias, sobretudo as de temática urbana. Ao mesmo tempo, começam a surgir preocupações no tocante à participação política e à justiça social, deixando entrever uma corrente subterrânea posteriormente aflorada à superfície.
Dividido entre os apelos da razão e do coração o escritor retorna a Clarissa em Música ao Longe. No prefácio que escreveu para a edição de 1956 da obra, de franca relevância para a compreensão do autor, considera-o “um livro medíocre, embora seu tema pudesse ter comportado uma certa grandiosidade, caso fosse bem tratado”. História escrita em “quinze ou vinte dias, especialmente para concorrer ao ‘Prêmio de Romance Machado de Assis’, instituído em 1934 pela Cia. Editora Nacional de São Paulo”.
Em Um Lugar ao Sol, o autor situa Clarissa e Vasco em Porto Alegre. E mais uma vez o prefácio, redigido para a edição de suas Obras (1956), se torna peça indispensável à avaliação da obra: o autor confessa tratar-se de”um romance desconjuntado”, por “reunir num mesmo livro personagens de histórias anteriores separadas no espaço”. E resume seu pensamento, dizendo que “Um Lugar ao Sol peca por ser uma transcrição demasiadamente literal da vida”.
Um Lugar ao Sol e as obras anteriores documentam a gradativa tomada de consciência de um ficcionista vigilante: cada narrativa é um passo adiante no aperfeiçoamento do ofício de contar histórias e, a um só tempo, na sondagem da realidade sem disfarces. Sua “educação sentimental”, o seu “romance de aprendizagem” é precisamente sua obra. Mas entendida esta em junção com a vida, a própria e a alheia, ou como espelho e germe da vida.
O que nos outros ficcionistas da época é uma busca nem sempre lograda, isto é, do literário como “errata da vida”, nele é uma constante. Não porque deixassem de recorrer ao baú da memória, senão porque se esquecem de que a fusão da Vida e da Literatura ganharia em aliviar o componente histórico, factual, em nome do existencial, ou essencial. E isso ele realiza plenamente. Tudo se passa como se não tendo acontecimentos pessoais a relatar, se dispusesse a procurar nas camadas profundas de sua interioridade, e nas dos semelhantes, a razão da obra literária. Assim, alcançava aquilo que os contemporâneos acreditavam encontrar no autobiográfico ou no mero realismo fotográfico. Se nada mais contivesse sua ficção bastava esse contributo pra lhe conferir um lugar à parte na Literatura do tempo.
Com Olhai os lírios do campo, o autor afasta-se da série novelesca em torno de Clarissa e outros. Experimentando ainda uma vez a técnica do contraponto, embora reduzida a dois planos – passado/presente –, o romance também se concentra na questão da solidariedade, representada pelo Cristianismo e pelo Socialismo.Eugênio casa-se com por interesse, depois de ligar-se intimamnete a Olívia. Mais tarde, farto de encenação, separa-se da mulher, e Olívia morre, deixando-lhe uma filha.
Pouco dura o interlúdio, e eis o autor de novo às voltas como o microcosmos das Clarissa: Saga. Distribuída sinfonicamente em três partes, a narrativa começa por situar Vasco engajado na Revolução Espanhola, ao lado das forças republicanas, depois num capo de concentração e, depois por fim, de regresso, para os braços de Clarissa e a mudança para o campo.
É das obras mais bem construídas da fase inicial de sua carreira. O assunto, deixando-lhe livre a imaginação, permitia-lhe trabalhar à vontade a matéria fictiva. Preparava-se, assim, para a empresa maior, não apenas a saga de um indivíduo perdido no torvelinho duma guerra cruenta e fratricida, senão a de um povo através de sua história: a do povo gaúcho. Atingia, finalmente, a completa realização de seu projeto, posto em prática, mesmo que involuntariamente, desde Clarissa: a saga do Rio Grande do Sul.
Todavia, antes de se lançar no seu mais ambicioso empreendimento – O tempo e o vento – o autor ainda tentará produzir romances, como O resto é silêncio, o qual não dissimula sua artificiosidade estrutural, o intelectualismo de sua concepção – o expediente deve reunir várias personagens em conseqüência de um suicídio que todas presenciam. Afinal, sua única, porém decisiva, falha: as conhecidas qualidades de observador entre lírico e realista saem comprometidas pela facilidade do achado técnico.
A pós um intervalo de sete anos , no qual apenas dera a lume A volta do Gato Preto, Érico Veríssimo retorna à cena literária com sua obra-prima: O Tempo e o Vento. Trilogia em cinco volumes, com os títulos de “O continente”, “O Retrato” e “O Arquipélago”, constitui um painel histórico do Rio Grande do Sul entre 1745 e 1945. Novela típica, marcada pela sucessão de acontecimentos na ordem do tempo.
Com o tempo e o Vento o escritor encontrava sua maneira mais funda de ser como homem e profissional das letras: a estrutura da novela, a serviço da epopéia de seu povo. Poucas vezes, na modernidade, a beleza da linguagem em prosa alcançou tal grau de transparência e emoção, como se cada aventura ou episódio pairasse numa zona intemporal e inespacial, próxima da lenda ou do mito.
O grande impacto da obra reside em “O Continente”. Graças ao tom épico, de mistura com um lirismo carregado de lendas, presságios e crendices, e ao mesmo tempo de um sentimento de aceitação meio animal do destino. Na segunda parte, ainda recuada no tempo, permanece algo desse perfume original, de rusticidade primitiva de desbravamento pioneiro. Mas em “O Arquipélago”, o registro como que jornalístico, de que o autor tinha plena consciência predomina. E as personagens, ou são históricas, e por isso limitadas pelo recorte verossímil que devem apresentar, ou herdeiras daquelas figuras remotas, pálidas mutações de sua energia bruta e telúrica. Decadência, numa palavra, como afinal desejava o novelista mostrar.
Em meio à trilogia, entre “O Retrato” e “O Arquipélago” o escritor publica uma obra autônoma: Noite. O clima que permeia a narrativa é o da belle époque, para os lados do Decadentismo: o absurdo provém do vago, do indeciso, do indeterminado, como se tudo ao passasse de pesadelo ou delírio do narrador. Clima fantasmagórico, que lembraria ainda a ficção introspectiva em moda no tempo. Tudo, diálogos, monólogos interiores, cenas e situações, transpira atmosfera onírica, espectral, poética, onde o realismo cede lugar ao imaginário doe viés simbolista. Noite parece retomar e alargar, no seu penumbrismo decadente, o tom lírico do ciclo de Clarissa.
Não obstante, o autor ainda explorará o absurdo em Incidente em Antares, espécie de fábula moderna, entre satírica e fantástica, ao redor de um acontecimento ocorrido em Antares, cidade gaúcha imaginária, no dia 13 de dezembro de 1963. Sobre um fundo histórico verídico esbate-se o insólito evento, gerado pela greve dos operários: mortos insepultos deblateram com os vivos numa praça em Antares.
O narrador esmera-se em minúcias histórico-políticas, inclusive referindo protagonistas reais. Espécie de trabalho forçado, tarefa imposta pela coerência ideológica à imaginação, mais História e/ou Jornalismo que Literatura, a narrativa não esconde sua monotonia, sobretudo durante a fastidiosa reconstituição histórica.
Nas derradeiras obras, Érico Veríssimo deixa o ambiente gaúcho, dando expansão ao seu cosmopolitismo latente. O Senhor embaixador passa-se em Washington – que o autor teria conhecido de perto-, observa-se análoga contensão. A vida cinematográfica e huxleyana transforma-se numa visão crítica e meio ácida, com notas de natureza política. Essa metamorfose não envolve, porém a recusa da objetividade, que é sinônimo de coerência, honestidade e lucidez, em favos da análise unilateral, maniqueísta, dos problemas sociais e ideológicos.
A notória atualidade dO Senhor Embaixador implica o adensamento da participação política do escritor, que a obra seguinte e última, O Prisioneiro confirmaria. Agora, o teatro das operações é o Sudoeste Asiático. Não importa que o drama se desenrole longe de suas vistas: levado pela proverbial generosidade, ele se engaja na luta pelos direitos humanos, acima dos partidos e das ideologias.
Não surpreende que sejam complementares e não conflitantes as duas faces de sua obra: a gaúcha telúrica expressa em novelas, a gaúcha citadina e cosmopolita, moldada em romances. Seja buscando retratar o homo gauchus, seja projetando-o no homo universalis, umas e outras carregam um não seu quê de comovente e atual que resiste à prova do tempo.
O fascínio de Érico Veríssimo reside no fato de ser um escritor aberto, franco que logo atrai o leitor para a sua intimidade, para o convívio com os seres que lhe povoam a mente. Narra como se desfiasse confidências, num à vontade de quem não tem nada a esconder e, a um só tempo, guarda tesouros de fantasia, não raro extraídos da vivência, sua ou alheia, submetida ao crivo da imaginação. Narrativas que passamos a crer sejam as da própria vida: ficção e realidade se fundem, numa simbiose em que não se sabe o que mais salientar, se a ficção permeada pela vida, se esta iluminada por aquela. Um ficcionista de garra, dono dum invulgar dom de empatia, que nem todos os pares ostentam.


Livro: MOISÉS, Massaud. História da Literatura Brasileira: Modernismo. 3ª ed, revista e aumentada. São Paulo, SP: Cultrix, 1996. p. 223 a 236.

O Senhor Embaixador


Este é o primeiro livro que Érico Veríssimo escreveu após sua consagrada trilogia O Tempo e o Vento e representa uma experiência nova na carreira do romancista, a essa altura já enriquecida de títulos e temas tão diversos como Clarissa e Noite, Caminhos Cruzados e Olhai os Lírios do Campo.
Nas primeiras três partes do romance, - As Credenciais, A Festa e O Carrossel -, a ação se desenvolve em Washington D.C..A última - intitulada A Montanha - tem por cenário a República do Sacramento, ilha do Caribe governada despoticamente por um militar que conta com o amparo duma oligarquia rural e de duas companhias norte-americanas. A estória tem início na manhã em que Don Gabriel Heliodoro Alvarado entrega ao Presidente Eisenhower, em Washington, suas credenciais de embaixador. Nesse mesmo dia o leitor já travava conhecimento com as principais personagens do livro - uma das mais ricas e expressivas galerias de tipos já criadas pelo ficcionista gaúcho: Juventino Carrera, o ditador sacramentenho; Pablo Ortega, um primeiro-secretário com tendências liberais; Pancho Vivanco e sua mulher Rosalía; Jorge Molina, o ministro conselheiro que se debate numa inesgotável crise de fé; Leonardo Gris, um humanista, exilado político a conspirar com alguns compatriotas para a derrubada do tirano; Glenda Doremus, uma americana racista e problematizada; Bill Godkin, um "gringo tranqüilo", especialista em assuntos latino-americanos numa agência de notícias; o Gen. Hugo Ugarte, adido militar da embaixada, um dos mais corruptos e cruéis chefes de polícia que a capital de Sacramento já vira. Nesse verdadeiro "carrossel diplomático" tem o leitor a visão de um universo de interesses em debate, no centro do qual avulta a pessoa de Gabriel Heliodoro Alvarado, o modelo do protegido político, do homem "leal ao regime e de notáveis serviços à causa da República".
O Senhor Embaixador é um livro escrito com apaixonada franqueza. Fala dos gravíssimos problemas que afetam a nossa época e o nosso continente. Mas é essencialmente um estudo da natureza humana, do homem como um ser em permanente estado de tensão. É uma narrativa de amplos recursos e propósitos e pode ser comparada, como sugere seu próprio autor, a um foguete que, uma vez acesso, começa a erguer-se vagarosamente - pois no início a estória parece apenas ser uma comédia satírica de costumes diplomáticos - mas em breve ganha ímpeto, sobe com a força de um rojão - e acaba explodindo, alto, numa tragédia...

[Comentário extraído do livro O Senhor Embaixador (contracapa)]


O Senhor Embaixador é o primeiro romance em importância após a trilogia de O Tempo e o Vento. Esse livro revelou mudanças no romancista. Nele não se encontram formalismos literários ou truques de narração, é o narrador puro. O romancista mostra a sua história em estado de pureza e primitivismo. Em toda a obra, pode-se perceber o realismo em que o romancista mostra e descreve, como diz Antônio Cândido:
“O embaixador do romance, amigo do ditador que governa a pequena República das Caraíbas, é a um tempo romântico e patético, no seu esforço de se equilibrar entre a sobriedade do meio em que agora vive e a violência de seu passado e dos amores que o cercam. Aí, torna-se importante o lado sexual da história, com casos e contracasos acontecendo nos meios burocrático-diplomáticos de Washington. Poucas vezes terá um romancista brasileiro sido tão direto no revelar os bastidores de um ambiente. (...) O Senhor Embaixador volta a por um narrador brasileiro em campo internacional, e , desta vez, com tal despojamento de literatices que vai ao encontro da narrativa pura, sem falseamentos tidos como literários, numa tradição que vem do tempo em que nossos antepassados se reuniam, em cavernas, ao redor de quem soubesse contar, com direiteza e realismo, uma história”.



quarta-feira, 21 de maio de 2008

Iniciando nossa jornada ...



Introdução

Durante setenta anos convivemos com um grande escritor, representante de nossa literatura nacional. Nasceu, no Rio Grande do Sul em 1905 e faleceu em 1975, Érico Lopes Veríssimo. Conheceu desde cedo a decadência, pois sua família rica e tradicional arruinou-se no início do século. Ainda jovem, exerceu diversas profissões da pequena classe média, tais como: ajudante de comércio, bancário, lojista de farmácia. Nesta época, foi atraído por leituras de Machado, Swift e Shaw.
Em 1930, Érico Veríssimo muda-se para Porto Alegre, aproximando-se do expoente do Modernismo gaúcho, Augusto Meyer; este por sua vez, encaminha o estreante para o jornalismo literário. O escritor inicia, então, com alguns contos, que em 1932, seriam reunidos sob o título Fantoches, editados pela Globo, cuja revista secretariava.
De 33 até o fim do decênio, os críticos reconhecem em Veríssimo a presença de certa ficção inglesa e norte-americana, devido à composição dos romances do ciclo de Vasco e Clarissa.
O autor ainda esteve muitas vezes nos Estados Unidos, onde lecionou literatura brasileira e dirigiu um dos departamentos culturais da Organização dos Estados Americanos.
Registros animados da vida ianque são Gato Preto em Campo de Neve e A Volta do Gato Preto.


De 1948 a 1960, Veríssimo inclina-se para obras dedicadas à elaboração da trilogia da vida gaúcha que é O Tempo e o Vento. Mais recentemente, voltou-se para questões políticas de nosso país, baseando suas obras sob esta perspectiva.

Obras



Suas obras foram compiladas em três ocasiões:



Obras de Érico Veríssimo – 1956 (17 volumes)
Obras completas – 1961 (10 volumes)
Ficção completa – 1966 (5 volumes)


Os livros de Érico Veríssimo foram traduzidos para o alemão, espanhol, finlandês, francês, holandês, húngaro, indonésio, inglês, italiano, japonês, norueguês, polonês, romeno, russo, sueco e tcheco.

Contos



Fantoches
As mãos de meu filho
O ataque
Os devaneios do general



Romances



Clarissa – 1933
Caminhos cruzados – 1935
Música ao longe – 1936
Um lugar ao sol – 1936
Olhai os lírios do campo – 1938
Saga – 1940
O resto é silêncio – 1943
O tempo e o vento (1ª parte) — O continente – 1949
O tempo e o vento (2ª parte) — O retrato – 1951
O tempo e o vento (3ª parte) — O arquipélago – 1961
O senhor embaixador – 1965
O prisioneiro – 1967
Incidente em Antares – 1971



Novelas



Noite (a publicação em
Portugal contém ainda "A Sonata", uma pequena história sobre um solitário professor de música que se vê transportado ao passado, ao ano de seu nascimento, onde se apaixona por uma bela mulher) – 1954



Literatura infanto-juvenil



A vida de Joana d'Arc – 1935
As aventuras do avião vermelho – 1936
Os três porquinhos pobres – 1936
Rosa Maria no castelo encantado – 1936
Meu ABC – 1936
As aventuras de Tibicuera – 1937
O urso com música na barriga – 1938
A vida do elefante Basílio – 1939
Outra vez os três porquinhos – 1939
Viagem à aurora do mundo – 1939
Aventuras no mundo da higiene – 1939
Gente e bichos – 1956



Narrativas de viagens



Gato preto em campo de neve – 1941
A volta do gato preto – 1946
México – 1957
Israel em abril – 1969



Autobiografias



O escritor diante do espelho – 1966 (em “Ficção Completa”)
Solo de clarineta – Memórias (1º volume) – 1973
Solo de clarineta – Memórias 2 – 1976 (ed. póstuma, organizada por Flávio L. Chaves)



Ensaios



Brazilian Literature – an Outline – 1945
Mundo velho sem porteira – 1973
Breve história da literatura brasileira – 1995 (tradução de Maria da Glória Bordini)



Biografias



Um certo Henrique Bertaso – 1972



Traduções



Romances



O sineiro (The Ringer), de
Edgar Wallace – 1931
O círculo vermelho (The Crimson Circle), de Edgar Wallace – 1931
A porta das sete chaves (The Door with Seven Locks), de Edgar Wallace – 1931
Classe 1902 (Jahrgang 1902), de
Ernst Glaeser – 1933
Contraponto (Point Counter Point), de
Aldous Huxley – 1934
E agora, seu moço? (Kleiner Mann, Was nun?), de
Hans Fallada – 1937
Não estamos sós (We Are Not Alone), de
James Hilton – 1940
Adeus Mr. Chips (
Goodbye Mr. Chips), de James Hilton – 1940
Ratos e homens (
Of Mice and Men), de John Steinbeck – 1940
O retrato de Jennie (Portrait of Jennie), de
Robert Nathan – 1942
Mas não se mata cavalo? (
They Shoot Horses, Don't They?), de Horace McCoy – 1947
Maquiavel e a dama (Then and Now), de
Somerset Maugham – 1948
A pista do alfinete novo (The Clue of the New Pin), de Edgar Wallace – 1956



Contos



Psicologia (Psychology), de
Katherine Mansfield – 1939 (Revista do Globo)
Felicidade (Bliss), de Katherine Mansfield – 1940
O meu primeiro baile (Her First Ball), de Katherine Mansfield – 1940 (Revista do Globo)

Fontes:

BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 43 ed. São Paulo:Cultrix,2006.

http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%89rico_Ver%C3%ADssimo ( Acessado em 21 de maio de 2008 às 20 horas e 8 minutos ).

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Nossas perspectivas!

Com este blog, pretendemos apreender e conhecer mais da vida e obra de Érico Veríssimo.Através de comentários, sugestões e contribuições de nossos visitadores certamente alcançaremos novos perfis de pensamento sobre suas obras.

Nosso trabalho se baseará em leituras teóricas e de suas publicações.Visamos contribuir adicionando dados de sua jornada nas letras, vida, trabalho e edições. Por fim, buscamos analisar algumas de suas obras. Contamos com sua colaboração nos comentários e contribuições para nosso blog.

Boas vindas ao nosso blog!

Olá, como vai?

Seja bem-vindo ao nosso blog! Este espaço é nosso e seu também! Queremos , aqui, estudar , pesquisar e juntos aprendermos mais sobre a vida e obra do autor Érico Veríssimo, um forte representante da nossa literatura brasileira. Como estudiosos, pesquisadores e leitores cremos que será uma maravilhosa viagem pelas letras na busca do conhecimento por mais um dos nossos grandes autores!

Fique à vontade para ler, comentar e deixar seus recados, juntos, trocaremos informações e cresceremos! Seja bem-vindo!

O grupo ...